O entrevistado desta semana é Paulo Junior Trindade dos Santos.
Paulo Junior Trindade dos Santos é Pós-Doutorando em Direito pela Unoesc-SC com bolsa Capes/Pndp. Professor colaborador na Pós-Graduação da Unoesc-SC. Pós-Doutor, Doutor e Mestre em Direito pela UNISINOS-RS com bolsa Capes/Cnpq (Mestrado) e Capes/Proex (Doutorado).
Dedicado a Teses e Dissertações de notório mérito acadêmico, o Prêmio Academy CAED-Jus 2018 destinou-se a produções em direito e áreas conexas. Em meio a diversas teses nacionais e estrangeiras que participaram da seleção, Paulo Junior foi o premiado na categoria Teses com o título “Filosofia do direito processual (da jurisdição ao processo): o fenômeno conflitológico de interesses como gênese do direito”. A tese foi orientada por Darci Guimarães Ribeiro.
Confira a entrevista:
1) Você é o vencedor do Prêmio Academy CAED-Jus 2018 – Teses. Nos conte um pouco como foi a sua trajetória acadêmica até o Prêmio.
Sou filho de um mecânico e de uma professora. Venho de Ponte Serrada, Santa Catarina, cidade com aproximadamente dez mil habitantes. Via meu pai trabalhar muito duro para conseguir prover o necessário ao lar, e vi minha mãe, já madura, indo fazer a faculdade e dar aula para ajudar o auxílio no lar. Por um espaço de tempo a profissão de meu pai bastava para o sustento da família, porém, devido aos riscos da profissão, decorrentes do peso e dos materiais com os quais ele lidava, seguidamente machucava-se, a ponto de minha mãe decidir que teria também de auxiliar em casa. Meu pai apoiava-me intensamente nos estudos, pois ele não teve oportunidades e sempre sonhou com novas perspectivas aos filhos. Quando eu não estudava como devia, meu pai colocava-me para trabalhar, para ver o quanto era difícil e desgastante a sua profissão, com o fim de me animar. E deu certo. Na Graduação dediquei-me muito aos estudos, a ponto de apresentar meu Trabalho de Conclusão, à convite da instituição, na USP-SP. Interessei-me profundamente pela pesquisa e pelo modo como ela abria um novo mundo ao Direito, deveras dogmático na Graduação. A Pós-Graduação foi uma consequência desse interesse na pesquisa científica do Direito, mas este sonho parecia distante em um primeiro momento, pois não tinha condições financeiras para tanto. Com o apoio de um grande amigo, professor na Graduação, o qual sempre acreditou em meu potencial, fui fazer a prova do Mestrado na UNISINOS-RS. Lá, não conhecia ninguém, fui sem grandes expectativas. Entretanto, o resultado da prova foi animador: fiquei entre os três primeiros colocados; prova que reúne normalmente mais de 200 competidores. A consequência positiva foi a bolsa, o auxílio que eu necessitava para realizar meu sonho, de modo que mudei-me de Ponte Serrada-SC para São Leopoldo-RS, cidade na qual permaneci por mais de oito anos. O Doutorado veio na sequência, em cuja prova me classifiquei em segundo lugar, também ganhando auxílio financeiro para dar continuidade à pesquisa. O auxílio das bolsas foram fundamentais para minha Tese de Doutoramento, pois pude dedicar-me com exclusividade aos estudos. Nesses anos de Mestrado e Doutorado trabalhei como pesquisador integralmente, o que, a meu ver, foi o grande contributo para a elaboração de minha Tese, pois sinto que nela consegui agregar todos os anos de conhecimento na minha – ainda em curso – formação acadêmica. Poderia dizer que esta foi minha trajetória acadêmica, a grosso modo, mas não poderia deixar de mencionar que nesses oito anos dedicados ao crescimento acadêmico tive a ajuda de muitos amigos, cujas discussões, indicações de livro, foram fundamentais para meu crescimento e amadurecimento como pesquisador, assim como o auxílio da família, principalmente em forma de compreensão pela distância, devido a perda de muitos momentos familiares. Perdi entes queridos nesses anos, como meus avós e meu pai (na “reta final” de elaboração da tese), os quais apoiavam-me incansavelmente em minha carreira acadêmica e com os quais não convivi em seus últimos anos. O estudo não existe sem muito amor e dedicação, e não é construído sozinho. Sei que minha curiosidade e abertura para o mundo foram fundamentais para os méritos que alcancei e me orgulho muito em poder dizer que cada página de minha Tese foi elaborada com muito amor, reflexão e discussão.
2) O que mais lhe chamou atenção no Prêmio?
O Prêmio chamou atenção pelo sólido respaldo científico e acadêmico do CAED-Jus, razão pela qual, inclusive, enviei meu trabalho. Também, após a inscrição o que chamou a atenção foi o grande fluxo de participantes: mais de 1300 candidatos de 22 nacionalidades, o que desvela o impacto social e grande relevância do prêmio para a comunidade jurídica, pois principalmente a grande aderência desses pesquisadores das mais diversas nacionalidades respalda a premiação.
3) O título da sua tese é “Filosofia do direito processual (da jurisdição ao processo): o fenômeno conflitológico de interesses como gênese do direito”. As pessoas poderão acessá-la no livro a ser publicado pelo CAED-Jus, mas poderia nos contar em linhas gerais do que ela se trata?
Minha pesquisa no Mestrado e Doutorado foi ancorada na linha 1 do PPG da Unisinos: Hermenêutica, Constituição e Concretização dos Direitos e minha Linha de Pesquisa foi o Processo Civil. Desde que tive os primeiros contatos com a academia, em minhas pesquisas sempre busquei evidenciar um elemento que a dogmática esconde muito bem: o elemento humano. O resgate desse elemento é fundamental para que a pesquisa torne-se rica e densa, e perpasse o campo restrito que a ciência autorreferencial do direito apresenta, num primeiro momento. Sempre nutri uma paixão pela Teoria do Direito, então busquei uni-la ao Processo Civil, o que culminou na Tese de Doutoramento. Em linhas gerais, a Tese visa um estudo da Ciência Processual pela perspectiva transdisciplinar do Direito e apresentando um elemento o qual julgo fundamental para a compreensão do trabalho: a passagem da jurisdição ao processo; ou seja, a passagem de uma centralidade na teoria da decisão e na jurisdição para o processo civil. Desde modo, não me ative a visualizar o processo somente em sua decisão, mas sim, com meus estudos, vi que somente o processo civil pode ser um local de participação social no direito para a produção jurídica, pois até então o Direito está demasiadamente marcado, de um lado, pela filosofia da consciência e, de outro, por uma visão ainda demasiada dogmática do direito reduzido à lei. Como gosto de observar a sociedade em suas expressões plurais, bem como gosto de refletir os impactos de nossa sociedade atual – complexa, globalizada, pós/hiper/trans-moderna – apontei na Tese que os institutos jurídicos estão presos a um paradigma ultrapassado de ciência, não mais servindo – democraticamente – para o Direito em uma sociedade como a que se vive. Assim, tendo como objeto o Processo Civil, procurei ressignificara a dinâmica processual, apontando que o processo pode servir à democracia e oportunizar um protagonismo social, em tempos nos quais a sociedade sente-se totalmente distante de qualquer instituição. A passagem realizada da jurisdição ao processo mostra que o direito é muito mais amplo que a Lei, mas que também esse direito não pode ser disposto de qualquer modo pelos Tribunais, servindo o processo como possibilidade de sanar essa senda existente entre direito e sociedade. Porém, me foi revelado pela Tese que o processo civil não é visto em sua potencialidade democrática, sendo reduzido à lei ou, pior, desconsiderado pelos juízes quando da decisão judicial, o que frustra tanto os advogados como as partes – e a sociedade como um todo. A transdisciplinariedade utilizada me revelou que a conflitualidade humana expressa a dinamicidade da vida como uma fonte de Direito vivo, o que nos remente a uma possibilidade de o processo ser um canal para criação de um direito vivo. Convido a todos para que realizem leitura do meu trabalho para que juntos possamos discutir.
4) Bom, outros juristas vão se espelhar em você para participarem das próximas iniciativas do CAED-Jus. Que dicas finais você daria para que possam produzir artigos de qualidade e inovadores no direito?
A pesquisa se move em uma direção: impacto social. O impacto social por meio de uma pesquisa jurídica séria é perfeitamente possível, pois em muitas situações, conforme nos cotidianamente é alcançado, é o direito que vai traçar humanidades lá onde inexistem; assim como poderá dar voz aqueles que não possuem. Importantes teóricos das ciências discutem o espaço das ciências humanas na produção de conhecimento e vejo que sim, o direito é uma ciência e pode produzir muito conhecimento de qualidade, atuando como ferramenta de humanização. Este caminho, no entanto, não é simples, e vejo que no direito uma pesquisa rica é uma pesquisa transdisciplinar, que não ignore autores por preconceitos teóricos, que o pesquisador saiba ser humilde, aberto às informações e discussões e que mergulhe na sua pesquisa com compromisso e sabendo de sua responsabilidade pela produção – principalmente em um campo onde pode-se falar em um impacto direto junto à sociedade.
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