O entrevistado da vez é o Flavio Albuquerque Neto.
Flavio Albuquerque Neto é Doutor em História pela UFPE (2015); Professor e Pesquisador do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE). Pesquisador nos seguintes temas: História das prisões e dos prisioneiros; Educação prisional; Prisões e Direitos Humanos. Diretor de Pesquisa na Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação do IFPE.
Atuou como pesquisador no Diagnóstico de Segurança Pública (Senasp/MJ, 2019) e no Senso de Leitura nos Sistemas Prisional e Socioeducativo (CNJ, 2022). Organizador da coletânea “História das Prisões no Brasil (2 vols; Editora Rocco, 2009; Editora Anfiteatro, 2017).
Nesse momento, coordenador do GT 5 – CRIMES E SEGURANÇA PÚBLICA.
Confira a entrevista:
1) Quais foram as principais influências ou experiências que moldaram sua abordagem acadêmica até hoje?
Me interessei em estudar prisões e temas afins ainda na graduação em História, na Universidade Federal de Pernambuco, época em que iniciei pesquisas sobre modelos arquitetônicos para prisões brasileiras no século XIX. Por isso, a Casa de Detenção do Recife (hoje Casa da Cultura de Pernambuco) foi meu objeto de estudo tanto no mestrado, quanto no doutorado. No final dos anos 2000, contando com a colaboração de uma rede de historiadores de diversos estados, que estudavam os sistemas prisionais em suas respectivas localidades, lançamos a coletânea “História das Prisões no Brasil” (Rio de Janeiro: Rocco, 2009), que teve excelente recepção no país e na América Latina. Após ingressar como docente no IFPE, comecei a trabalhar com orientação de estudantes que me procuraram para o desenvolvimento de projetos sobre o sistema prisional atual no Brasil. Em todo esse período, segui participando de bancas, eventos, coletâneas e redes acadêmicas para afinar e aprofundar os debates sobre as os aparatos carcerários numa perspectiva multidisciplinar. Atualmente, meu interesse tem se voltado para a educação prisional. Em toda minha trajetória, nunca me limitei a leituras e debates apenas historiográficos, sempre privilegiando discussões (inclusive teóricas e metodológicas) multidisciplinares.
2) Como a sua experiência acadêmica prévia contribui para a sua visão sobre os desafios e oportunidades do seu GT no CAED-Jus?
O grande desafio do GT é, sem dúvida, primar pelo debate inter, trans e multidisciplinar, para que se promova um GT rico, atual, dialogando com o que há de mais recente na produção acadêmica sobre crimes e segurança pública. Assim, considero que minha experiência, ao estudar as prisões brasileiras em uma perspectiva multidisciplinar numa abordagem histórica, contribuirá para que o GT funcione da maneira que esperamos. A formação e linhas de pesquisa dos outros colegas coordenadores certamente também contribuirão fortemente para esse diálogo.
3) Como você enxerga o papel do CAED-Jus na formação de novos profissionais do direito e em outras áreas interdisciplinares?
Eu destaco duas dimensões no papel do CAED-Jus na formação dos novos quadros do Direito: 1. Integração com outras áreas: o CAED-Jus estimula a interdisciplinaridade ao promover eventos, debates e publicações que conectam o Direito a outras áreas, como Sociologia, Economia, Psicologia, Tecnologia, Educação, História, entre outras, ampliando a visão dos profissionais, preparando-os para lidar com questões complexas e multifacetadas. 2. Abordagem de temas contemporâneos: ao tratar de temas como inteligência artificial, inovação tecnológica, sustentabilidade, justiça social, entre outros, o CAED-Jus ajuda os profissionais a entenderem como o Direito se relaciona com outras disciplinas e, principalmente, com os desafios impostos pelo mundo atual.
4) A temática do seu GT é fundamental para pensar o direito de maneira interdisciplinar. O que você concebe como principal desafio da sua temática?
O fenômeno do crime é bastante complexo, não podendo ser entendido apenas em seu aspecto jurídico. Nessa mesma perspectiva, falar em segurança pública não consiste somente em dispor de mais efetivo policial nas ruas ou aumentar o número de vagas no sistema prisional. Esses são assuntos que requerem amplas reflexões, que devem, obrigatoriamente, perpassar por diversos saberes e setores da sociedade: gestão pública, educação, saúde, lazer, sociologia, criminologia, trabalho e empregabilidade, psicologia, etc. Portanto, o grande desafio em discutir segurança pública e crimes – ou criminalidade – reside em promover um debate inter, multi e transdisciplinar, fazendo com que tenhamos a real dimensão da complexidade desses fenômenos, para que não caiamos nos mesmos erros e simplificações tão comuns no cotidiano brasileiro, a exemplo da dispendiosa guerra às drogas ou o encarceramento massivo.
5) De que maneira você acha que sua área de pesquisa pode impactar a transformação ou inovação no campo jurídico, especialmente em termos interdisciplinares?
A História desempenha um papel crucial nas atualizações do campo jurídico ao fornecer uma base contextual e crítica para a evolução das leis, das práticas e das instituições jurídicas. O estudo histórico permite uma análise crítica sobre como interpretações e aplicações do Direito evoluíram ao longo do tempo. Isso pode inspirar novas abordagens ou questionar práticas enraizadas que não mais refletem os valores contemporâneos. Além disso, ao propor diálogo com outras disciplinas, como a Sociologia, a Antropologia e a Ciência Política, enriquece a compreensão do Direito como um fenômeno social dinâmico. Essa interação pode levar a inovações na forma como o direito aborda questões como direitos humanos, igualdade e justiça social.
6) Quais recursos ou estratégias você utilizou para manter-se atualizado(a) e relevante dentro da sua área de pesquisa?
Primeiramente, sempre mantive as leituras atualizadas. Para isso, além de frequentar livrarias e bibliotecas, utilizo com frequência ferramentas como portais de periódicos, para consultar artigos em veículos relevantes, bem como repositórios institucionais de universidades, buscando as produções mais recentes principalmente no âmbito dos programas de pós-graduação stricto sensu (mestrados e doutorados). Em segundo lugar, frequentar eventos acadêmicos também é importante para conhecermos as pesquisas recentes e os jovens pesquisadores.
7) Para quem está começando a se envolver com projetos interdisciplinares, qual habilidade você acredita ser essencial para o sucesso nesse tipo de iniciativa?
Em primeiro lugar, considero que uma habilidade essencial para o sucesso nesse tipo de projeto é a capacidade de comunicação eficaz. Essa habilidade vai além de simplesmente saber falar ou escrever bem; envolve a capacidade de articular ideias de forma clara e adaptar a linguagem para diferentes públicos e áreas de conhecimento. Outras habilidades fundamentais são o pensamento crítico e a curiosidade intelectual, sem imposição de barreiras epistemológicas entre as diversas áreas do conhecimento. E leitura! Muita leitura.
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